Após um atraso inicial na colheita de soja no Centro-Oeste, os trabalhos na região nunca ficaram tão concentrados em um curto espaço de tempo quanto nesta safra 2024/25. Com isso, a demanda por transporte rodoviário também jamais foi tão acentuada quanto agora, segundo analistas e integrantes desse mercado. Nesse cenário de urgência para o deslocamento do grão pelas rodovias, tradings e transportadores relatam cancelamentos de fretes e leilões de preço entre os motoristas.
Para se ter ideia da concentração dos trabalhos de campo, em Mato Grosso, o maior produtor de soja do país, a colheita do grão chegou, no dia 28 de fevereiro, a 82,3% da área de plantio, segundo levantamento do Instituto Matogrossense de Economia Aplicada (Imea). Duas semanas antes, os trabalhos haviam ocorrido em 28% da área total.
O diretor de logística de uma das principais tradings do país afirmou ao Valor que o quadro atual não representa uma ruptura de abastecimento. Mas, segundo ele, o cancelamento de fretes agendados por motoristas e transportadoras “deu um trabalho acima do normal em fevereiro”.
Como a contratação de transporte rodoviário ocorre basicamente em aplicativos, motoristas autônomos têm cancelado carregamentos que haviam acertado previamente para fechar acordos de última hora que sejam mais lucrativos. Usuários de aplicativos como o Uber conhecem bem essa dinâmica.
O comportamento só não está ainda mais disseminado porque, diferentemente do que ocorre nas cidades, a relação entre o motorista, o transportador e o embarcador é de longo prazo. “A transportadora simplesmente deixa de contratar o caminhoneiro que faz isso. E, do ponto de vista do embarcador, o mesmo acontece se a transportadora quebrar o contrato”, afirmou Rodrigo Koelle, CEO da Strada, startup de logística que tem ADM, Amaggi, Cargill e Louis Dreyfus como sócias.
Koelle diz que, quando começa a colheita da soja, os estoques estão baixos nas fábricas e cerealistas e compromissos de exportação estão prontos. “Há interesse do comprador (trading) de receber o quanto antes. É natural que haja essa pressão assim que a safra fica pronta”, disse.
Para se proteger dos cancelamentos, as tradings recorrem ao chamado “overbooking”. “Se precisa carregar 10 mil toneladas por dia para encher um navio, o embarcador contrata 12 mil por dia. A multa do navio é muito mais cara”, afirmou Koelle.
Houve concentração da colheita porque em janeiro, quando algumas lavouras estavam prontas, choveu em Mato Grosso. Ao mesmo tempo, o produtor tinha de colher a soja até o fim de fevereiro para semear milho na janela ideal. Isso criou um cenário que deverá marcar o pico do preço do frete em 2025, diz Fernando Bastiani, pesquisador do Grupo de Pesquisa e Extensão em Logística Agroindustrial (EsalqLog) da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz.
Alta nos fretes
Segundo o levantamento da EsalqLog, os preços dos fretes rodoviários com origem em Mato Grosso subiram, em média, 30% em relação ao mesmo período do ano passado. De Sorriso ao porto de Santos (SP), por exemplo, o custo do transporte era, até o dia 21 de fevereiro, de R$ 523,33 por tonelada, em média. De Sorriso a Itaituba (PA), o custo, que era de R$ 264,48 em fevereiro de 2024, passou neste ano para R$ 326,71. Na semana móvel encerrada em 26 de fevereiro, os valores médios subiram 63% em relação à semana anterior.
O preço do frete rodoviário deverá continuar em patamar elevado com chegada da safra de milho, que elevará a demanda. “Devem ocorrer escoamentos simultâneos dessas commodities”, afirmou a Associação Nacional dos Exportadores (Anec).
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