O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou na quarta-feira (9) uma tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros, que entra em vigor a partir do dia 1º de agosto. Diferentemente de outros países, o governo do Brasil não respondeu com submissão à medida, e prometeu aplicar a Lei da Reciprocidade Comercial – ou seja, taxar de volta.
A “guerra comercial” entre as duas potências pode parecer um problema distante do brasileiro comum, limitado às grandes exportadoras nacionais. Mas, segundo Rodrigo Leite, professor de Finanças e Controle Gerencial do COPPEAD/UFRJ, o efeito poderá ser sentido no bolso de todos – só que não pelo caminho esperado, como uma alta repentina dos produtos, por exemplo, e sim pela alta do dólar.
“Quando você tem uma mudança assim na esfera do comércio internacional, o que acontece é que há um aumento no câmbio. Ou seja, o real se enfraquece. Com o real enfraquecido, as importações ficam mais caras, e por isso pesa na inflação”, explica.
Ou seja, mesmo que a tarifa atinja de início as exportações, o efeito indireto pode ser um real mais fraco, produtos importados mais caros e inflação em alta.
Compras cotidianas podem baratear
O Brasil exporta para os americanos produtos que fazem parte do cotidiano – seja na mesa, como o café, carne bovina e a laranja, ou nas indústrias, como o aço e celulose. Para Rodrigo, pode até haver um pequeno alívio nos preços internos se esses produtos perderem espaço lá fora.
“Talvez tenha até um efeito pequeno positivo, de haver uma maior oferta desses produtos no mercado doméstico e, por causa disso, o preço cair. Mas não afeta tanto, especialmente porque há outros parceiros comerciais que poderiam absorver parte dessa oferta”, diz.
Caso os Estados Unidos deixem de importar os produtos brasileiros, nosso mercado precisaria redirecionar suas exportações. Segundo o professor, a principal alternativa seria a Europa, mas a mudança não é tão simples e pode trazer efeitos de curto prazo.
“O Brasil teria que exportar mais para a União Europeia, especialmente para lá, porque a China já compra muitos produtos brasileiros. Exportar mais para a China não é tão viável, até porque isso torna o Brasil bastante vulnerável ao mercado chinês.”
“Em termos de emprego, produção e renda, não muda tanto no longo prazo. No curto prazo, pode haver um choque na demanda por esses produtos. É possível que alguns setores – especialmente o setor aeronáutico, o setor de petróleo, e setores de commodities como a Vale – sofram com algumas demissões no curto prazo. Mas só nesses setores, não na economia como um todo”, diz o economista.
E se o Brasil taxar de volta?
A Lei da Reciprocidade, mencionada por Lula, prevê que o país taxe os produtos americanos proporcionalmente. Para o economista, esse é o real motivo de alerta, já que a medida do governo pode sair pela culatra e atingir o próprio consumidor brasileiro.
Um balanço do 1º semestre de 2025 feito pela Amcham Brasil aponta que importamos dos Estados Unidos desde combustíveis e peças de avião até medicamentos, polímeros, máquinas e inseticidas. Esses produtos abastecem setores importantes da nossa economia, como a indústria, o agronegócio, o transporte e a saúde.
A taxação desses itens pode desbloquear um efeito em cadeia: tudo que depende deles para funcionar também pode encarecer. Se o preço das operações e dos custos sobe, isso mais cedo ou mais tarde chega no bolso do consumidor, seja no remédio, na comida ou no preço de uma passagem.
“Se o Brasil começar a taxar produtos dos Estados Unidos, aí sim haverá um efeito inflacionário muito grande, porque tudo que o Brasil importa de lá — desde material industrial, componentes eletrônicos, tecnologia, até produtos de consumo final — vai ficar mais caro. O iPhone, por exemplo, é uma coisa que ficaria mais cara. Esse é o ponto pelo qual o Brasil está reticente em aplicar a Lei de Reciprocidade Econômica. Quando você faz isso, está tentando atirar em outro país, mas apontando a arma para o seu próprio consumidor”, diz Rodrigo.
Para o economista, a resposta do Brasil até faz sentido do ponto de vista econômico, mas, na prática, seria repetir o mesmo erro que Trump comete com os estadunidenses.
“A gente estaria taxando os brasileiros para tentar afetar os Estados Unidos, que é o que o Trump está fazendo, está taxando mais os produtos brasileiros para os americanos para afetar o Brasil”.
Qual seria a ação mais estratégica para o Brasil?
Na visão de Rodrigo, no lugar de uma tarifa generalizada como a proposta por Trump, o Brasil poderia buscar formas mais pontuais e estratégicas de responder, que não afetassem tanto o consumidor local.
“O que teria mais efeito seria, por exemplo, atacar certas patentes específicas — como medicamentos, etc. Isso talvez seja uma forma mais localizada e estratégica do que simplesmente chegar e taxar tudo em 50%, como o Trump fez”, diz.