POR ANDREW KING E LIAM CASSIDY
A Terra já está ultrapassando o limite de 1,5°C de aquecimento global, de acordo com dois grandes estudos globais que, juntos, sugerem que o clima do planeta provavelmente entrou em uma nova e assustadora fase.
De acordo com o histórico Acordo de Paris de 2015 sobre mudança climática, a humanidade está buscando reduzir as emissões de gases de efeito estufa e manter o aquecimento do planeta a não mais que 1,5°C acima da média pré-industrial.
Em 2024, as temperaturas na Terra ultrapassaram esse limite, mas isso não foi suficiente para declarar que o limite de Paris havia sido ultrapassado, porque as metas de temperatura previstas no acordo são medidas ao longo de várias décadas e não em passagens curtas acima da marca de 1,5°C.
Mas os dois artigos recém-lançados usam uma medida diferente. Ambos examinaram dados climáticos históricos para determinar se anos muito quentes no passado recente já eram um sinal de que um limite de aquecimento futuro e de longo prazo seria ultrapassado.
A resposta, de forma alarmante, foi sim. Os pesquisadores dizem que o recorde de 2024 indica que a Terra está ultrapassando o limite de 1,5°C, além do qual os cientistas preveem danos catastróficos aos sistemas naturais que sustentam a vida na Terra.
2024: o primeiro ano de muitos acima do limite de 1,5°C de aquecimento
As organizações climáticas de todo o mundo concordam que o ano passado foi o mais quente já registrado. A temperatura média global em 2024 foi cerca de 1,6°C acima das temperaturas médias no final do século XIX, antes de os seres humanos começarem a queimar combustíveis fósseis em grande escala.
A Terra também experimentou recentemente dias e meses individuais acima da marca de 1,5°C de aquecimento.
Mas a temperatura global varia de um ano para o outro. Por exemplo, o pico de temperatura de 2024, embora em grande parte devido à mudança climática, também foi impulsionado por um padrão natural de El Niño no início do ano. Por enquanto, esse padrão se dissipou, e a previsão é que 2025 seja um pouco mais frio.
Essas flutuações ano a ano significam que os cientistas do clima não veem um único ano que ultrapasse a marca de 1,5°C como uma falha no cumprimento do Acordo de Paris.
No entanto, os novos estudos publicados hoje na Nature Climate Change sugerem que mesmo um único mês ou ano com aquecimento global de 1,5°C pode significar que a Terra está entrando em uma violação de longo prazo desse limite vital.
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O que os estudos descobriram
Os estudos foram realizados de forma independente por pesquisadores na Europa e no Canadá. Eles abordaram a mesma questão básica: um ano acima de 1,5°C de aquecimento global é um sinal de alerta de que já estamos ultrapassando o limite do Acordo de Paris?
Ambos os estudos usaram observações e simulações de modelos climáticos para abordar essa questão, com abordagens ligeiramente diferentes.
No artigo europeu, os pesquisadores analisaram as tendências históricas de aquecimento. Eles descobriram que quando a temperatura média da Terra atingia um determinado limite, o período de 20 anos seguinte também atingia esse limite.
Esse padrão sugere que, como a Terra atingiu 1,5°C de aquecimento no ano passado, podemos ter entrado em um período de aquecimento de 20 anos, quando as temperaturas médias também atingirão 1,5°C.
O artigo canadense envolveu dados mês a mês. Junho do ano passado foi o 12º mês consecutivo de temperaturas acima do nível de aquecimento de 1,5°C. O pesquisador descobriu que 12 meses consecutivos acima de um limite climático indicam que o limite será atingido a longo prazo.
Ambos os estudos também demonstram que, mesmo que a redução rigorosa das emissões comece agora, é provável que a Terra ainda esteja ultrapassando o limite de 1,5°C.
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Indo na direção errada
Diante dessas descobertas, o que a humanidade fará em seguida é crucial.
Há décadas, os cientistas do clima alertam que a queima de combustíveis fósseis para obter energia libera dióxido de carbono e outros gases que estão aquecendo o planeta.
Mas as emissões de gases de efeito estufa da humanidade continuaram a aumentar. Desde que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas divulgou seu primeiro relatório em 1990, as emissões anuais de dióxido de carbono do mundo aumentaram cerca de 50%.
Simplificando, não estamos nem mesmo nos movendo na direção certa, muito menos no ritmo necessário.
A ciência mostra que as emissões de gases de efeito estufa devem chegar a zero para acabar com o aquecimento global. Mesmo assim, alguns aspectos do clima continuarão a mudar por muitos séculos, porque parte do aquecimento regional, especialmente nos oceanos, já é irreversível.
Se a Terra de fato já ultrapassou a marca de 1,5°C e a humanidade quiser ficar abaixo desse limite novamente, precisaremos resfriar o planeta alcançando “emissões líquidas negativas” – removendo mais gases de efeito estufa da atmosfera do que emitimos. Essa seria uma tarefa altamente desafiadora.
Sentindo o calor
Os efeitos prejudiciais da mudança climática já estão sendo sentidos em todo o mundo. Os danos serão ainda piores para as gerações futuras.
A Austrália já experimentou 1,5°C de aquecimento, em média, desde 1910.
Ecossistemas únicos, como a Grande Barreira de Corais, já estão sofrendo com esse aquecimento. Os oceanos estão mais quentes e os mares estão subindo, atingindo os litorais e ameaçando a vida marinha.
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Incêndios florestais e condições climáticas extremas, especialmente ondas de calor, estão se tornando mais frequentes e severas. Isso exerce pressão sobre a natureza, a sociedade e nossa economia.
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Mas, em meio à escuridão, há sinais de progresso.
Em todo o mundo, a geração de eletricidade renovável está crescendo. O uso de combustíveis fósseis caiu em muitos países. Os desenvolvimentos tecnológicos estão diminuindo o crescimento das emissões em setores poluentes, como aviação e construção.
Mas é evidente que ainda há muito trabalho a ser feito.
A humanidade pode mudar a maré do planeta
Esses estudos são um lembrete preocupante de como a humanidade está aquém do necessário para lidar com as mudanças climáticas.
Elas mostram que precisamos nos adaptar urgentemente ao aumento do aquecimento global. Entre o conjunto de mudanças necessárias, as nações mais ricas devem apoiar os países mais pobres, que deverão suportar os danos climáticos mais graves. Embora algum progresso tenha sido feito nesse sentido, muito mais é necessário.
Também é necessária uma grande mudança para descarbonizar nossas sociedades e economias. Ainda há espaço para esperança, mas não podemos adiar a ação. Caso contrário, a humanidade continuará aquecendo o planeta e causando mais danos.
Andrew King – Professor associado de Ciências Climáticas pela Universidade de Melbourne.
Liam Cassidy – Mestre em Engenharia Mecânica pela Universidade do Estado do Oregon e candidato ao doutorado na Universidade de Melbourne.
Este texto foi republicado de The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original.
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